É um istopô



“ISTOPÔ BALAIO”[1]
Anderson d’ Almeida
Quem é de Sergipe e nunca ouviu o Coco da Capsulana, composição de João Alberto e Ismar Barreto interpretada por Amorosa, ou é ruim da cabeça ou doente do pé. A canção, vitoriosa no prestigiado Festival Canta Nordeste de 1993, tem uma originalidade em seu vocabulário que ratifica o que disse o escritor russo Liev Tolstói, “se queres ser universal, começa por pintar a tua aldeia”. Sem dúvida, o perfeito casamento entre letra, melodia, arranjo e interpretação fazem do Coco da Capsulana uma das mais belas pinturas da aldeia sergipana. Já na primeira estrofe, uma pincelada de nossa oralidade,
Botei na cuca de fazer um coco
Me deu gastura de ver como é
Gota serena do istopô balaio
Era fative que lhe dava pé

Observem que na terceira linha aparece o título desse texto: istopô balaio. A expressão é, a meu ver, uma variante de “estuporar”, de causar ou sofrer estupor, paralisia. No sentido figurado, espanto ou assombro. De estupor para estopô ou istopô foi um pulo, no decorrer de alguns séculos. O que interessa pra nós é que a palavra sobreviveu e ganhou um acompanhante, o balaio. Casamento perfeito entre imagem e som.
Do istopô, voltemos ao istoporar. Quem nunca ouviu uma vovozinha preocupada com o seu neto que está querendo comer ovo com abacaxi; manga com leite; melancia quente (do sol):  “Menino, isso istopora”!? Quem nunca ouviu aquele amigo ou amiga que passou da conta na hora do pirão e exclamou: “Comi de istoporar”!? Quem nunca ouviu numa briga de casal um dos dois desejar que o outro “istopore” de raiva, ou mesmo um dos lados exclamando que quase “istopora” de ódio do outro!? Se você nunca ouviu, pergunto-lhe: em que aldeia tu moras, istopô?
Passados 25 anos do Prêmio conquistado por Amorosa, desejamos que nós, a sociedade e a música sergipana não fiquemos nesse estupor, nessa paralisia. Assim como a própria palavra - que continua em movimento, resistindo a todas ofensivas possíveis e imagináveis – todos também podemos pintar quadros a partir de nossa aldeia. Podemos aprender a dançar e a cantar o coco. O coco da resistência, o coco da persistência, o coco do respeito, o coco da diversidade, o coco da igualdade. O coco de junho, o coco de maio.
 Gota serena do Istopô Balaio ! ! !   


[1] Publicado originalmente na Revista Impactos.

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